ALÉM DA LENDA, A PAIXÃO

 Autor: João Ludugero

Foi neste vasto vale
nessa Vargem agreste
nesse pasto 
que desce do Calango
que cerquei minha alma
de verde 
que dei a mim
a tua saudade...

E o silêncio do pasto
fiz por merecer,
porque não barrei
meu coração-borrego
que se foi embora,
desgarrado
junto com a mulher que chora
lenda a fora
dentro de um carro encantado
que seguiu descaminhos
Vapor a fora

Com sede e fome de querer
tuas curvas serenas, teus riachos
e a nostalgia que atravessa
os dias que alcançam a calma
que me faz estremecer
só de pensar que não posso mais 
te perder em mim, de certo


Banho de cavalos soltos, 
cheiro de curral, lenha,
fazenda de Ré da Viúva 
Seixos e lajedos ao vento 
água empoçada, lagoa comprida
ordenha, leite, vasilhas no jirau
e a paz que carrego nos ombros
eu consigo, faça sol ou chuva

Mas no peito se agita o coração,
tal qual égua desvairada,
que se contenta com a ilusão;
que prefere essa impostora
a ter que enfrentar seca e arado
no cultivo da terra 
que nos dá verso, poesia e chão

Minha Várzea quem diria,
agora me causa banzo
de um imenso quase beijo
de um dilacerado desejo
de um coração espantado,
que nunca te disse adeus!

Quero amanhecer assim, 
nas tuas ruas, nos teus becos,
ter um dedo de prosa ali na venda
de Dona Penha de Seu Olival
preciso sentar no banco
da praça Cleberval,
plantar meu olhar direto 
na verdejante algarobeira
sentir o sereno, bons ares 
advindos do rio Joca

Ir-me ao encontro 
do teu Vapor vital
e com as duas palmeiras 
da catedral de São Pedro, 
a servir de testemunhas,
quero apontar para tuas manhãs,
quero selar meu destino ao teu
com toda força e fé revelada, 
convicto de que minhas esperanças
se renovam nessa aliança de amor
que há entre eu e ti, 
minha Várzea amada!