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ESSE CABRA SOU EU, por João Maria Ludugero


A porteira do quintal 
dava às margens do rio Joca.
E aquele magote de moleques levados 
da breca pegava o beco de dona Neda.
E num piscar de olhos, lá estávamos, 
todos meninos e meninas, na beira do rio de Nozinho 
a tomar banho nas boias 
de câmaras-de-ar da oficina de Tonheiro.
A tarde caía amena. 
Na boca da noite, Horácio fechava o passadiço. 
Era o instante de a diversão 
tomar conta da rua do arame, 
antes de dar a hora de ir dormir.
Dentro, dependuradas nos armadores as redes 
de algodão de tear, memória do dia saudava 
a chegada da boiada de sonhos, 
agitando o cumeeira nas pálpebras do meninos.
Verde estética de lagarto tomando banho solar 
lá no paredão do açude do Calango.
Revoada de canários e periquitos 
primaverando a manhã varzeana.
Ainda boceja o horizonte com gosto de orvalho a tanger 
as folhas e catembas do verde coqueiral na beira do rio Joca.
Sensacional salto mortal de camaleão no tatame do vento.
Correria de borregos, cabritos 
e bezerros pelo labirinto da Várzea.
Cantiga de grilos, coaxar de sapos, jias e caçotes 
saltitantes na beira do rio ouvindo a hora passar 
sob a luz das bundas dos vaga-lumes.
No fogão de lenha, café com cuscuz de milho zarolho... 
Crepitam as achas no fogão à lenha:
- Quem vai querer grude, beiju, 
tapioca de coco ou brote de araruta?
Pé de mamão carregado de frutos 
a madurar bem alto só pra sanhaço se fartar. 
Azinhavrada moenda de caldo de cana 
no quintal dando água na boca da meninada. 
Cerca de varas entrelaçadas, difícil de pular. 
Roçado de feijão, milho, macaxeira, 
batata-doce, maxixe, melancia e jerimuns 
a enramar pelos leirões do Vapor.
Sino de São Pedro a badalar 
a hora do Angelus, Ave Maria!
- Vem jantar! Poente alaranjado, 
quase embriagado de vermelho tinto.
A lua se achega mais perto, 
airosa a enfeitar de prata a sela da noite.
Madrugada a dentro o cantar do galo 
quebra a barra da manhã dos Quilaras.
Acorda menino: - Já é hora de levantar! 
E o sol se levanta todo sorridente a pintar o dia 
do cabra varzeano, menino medonho e arteiro, 
tão cheio de energia, repleto de estripulias 
e teimosas esperanças novas.
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João Maria Ludugero

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